Como se viu na primeira parte deste artigo
(veja aqui), estamos acordando agora para um nicho que cresce a cada dia:
O produto Artesanal.
Se torna necessário que busquemos garantir a nossa própria identidade, nosso lugar ao sol. É necessário que também possamos regularizar nossos produtos, pois o próprio consumidor, cada dia mais, busca por eles.
O
Selo Arte, foi criado exatamente para este fim, para dar o primeiro passo nesta longa trilha. Sabemos que temos como chegar lá agora. Para tanto, é preciso nos adaptarmos enquanto produção, criarmos mecanismos que possam garantir também a segurança de nossos queijos artesanais.
E isto foi feito: a
Lei 13.680/2018, criada para reger os produtos artesanais de origem animal, dispõe requisitos e parâmetros necessários, como
Boas Práticas Agropecuárias e
Boas Práticas de Fabricação para que estes produtos possam ter salvaguarda na segurança da produção, no consumo e acima de tudo, que os mesmos possam estar acessíveis a todos, sem restrição geográfica!
Entretanto, a nova lei pode parecer complexa num primeiro momento. Ela retira dos órgãos tradicionais de fiscalização o poder de auditar estes produtos. No entanto, estas mudanças são gradativas e os Estados terão que se adaptar via ANVISA para o estabelecimento de um mecanismo viável de controle.
No mais, especialistas preveem que em aproximadamente 2 anos a coisa possa funcionar integralmente entre os estados da federação. É preciso também que
compreendamos o modelo proposto antes de julgá-lo como inseguro, já que muitas pesquisas nacionais e internacionais apontam dados positivos e esclarecedores sobre o mundo da produção com leite cru.
Muitos profissionais da indústria láctea rechaçam estas decisões, mas apenas porque não lidam diretamente com processos envolvendo
leite sem tratamento térmico. A falta de orientação e conhecimento científico relacionado ao tema nos mostra o quão ignorantes e preconceituosos ainda somos em se tratando de leite cru.
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Foto: arquivo pessoal[/caption]
Existe um mundo de possibilidades ali. Além do mais, estes profissionais foram forjados segundo uma ótica rigorosa de controles produtivos, sua consciência não consegue captar os novos paradigmas que o assunto abraça. É preciso estudar e analisar estes parâmetros e, acima de tudo, nos aliviarmos de tais preconceitos oriundos apenas uma forma de pensar.
É preciso sincretismo para compreender algumas destas facetas, pois se abriu um universo acadêmico totalmente novo ao profissional, que deve se adequar e se adaptar tecnicamente para compreendê-lo.
Não basta vender conceitos enraizados segundo a ótica dos fiscais do MAPA por exemplo (mesmo porque esses nunca se interessaram ao menos em ouvir as necessidades dos produtores artesanais), ou dos órgãos de defesa estaduais como o IMA, pois estes cargos são, em maioria, preenchidos por médicos veterinários que fatalmente não compreendem de todo o mundo lácteo e suas tecnologias, que aliás,
é competência do técnico ou tecnólogo em laticínios, não do veterinário.
Além do mais, o corporativismo intrínseco a estes órgãos e aos seus conselhos, fere violentamente qualquer prática diferente daquilo que seus conceitos preconizam. Imagino que estão preocupados com a perda de seu escopo de atuação, afinal sempre foram os manda-chuva nesse aspecto.
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Photo by Mitch Lensink on Unsplash[/caption]
É preciso acabar com o tabu, com o corporativismo do CFMV, com o preconceito de nossos profissionais do leite, e isso só vai acontecer quando buscarmos avidamente o conhecimento relacionado.
Diversos movimentos como o
Slowfood já sabem disso. Eles preconizam que, o que faz bem realmente, em termos alimentícios, é o natural, com menor uso possível de coadjuvantes e processos industriais. E isto não é recente, existem muitos precedentes, basta pesquisar.
Quanto às industrias registradas de forma tradicional, que não tenham receio em apoiar este movimento, pois todo o projeto visa fomentar os pequenos produtores, bem como a empresa familiar, pertencentes a um grupo econômico que há muito não recebe apoio de ninguém.
Sua luta pela sobrevivência agora conta com um importante aliado: O Selo Arte!
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Photo by rawpixel on Unsplash[/caption]
Nosso país não pode se dar ao luxo de deixá-los em segundo plano. Também não é preciso alarde com relação a concorrência mercadológica, o próprio consumidor e o mercado estão buscando novas alternativas.
Além do mais, estas produções são pequenas, não conseguem afetar as grandes indústrias já que o artesanal é um produto diferenciado e obviamente seus preços serão diferenciados com relação aos tradicionais.
Muitas destas questões merecem luz no entendimento das pessoas, e mesmo técnicos e profissionais do setor laticinista podem e devem compreendê-las. Quanto à própria questão da segurança, muito questionada por estes, podemos enfatizar que foram criados mecanismos para garantir que sejam usados os controles necessários para se ter um produto artesanal seguro.
Podemos citar um breve resumo: Nos animais deverá ser feito o Controle de sanidade animal que incluem exames de Brucelose e Tuberculose, individualmente e de forma frequente; Já na matéria-prima será feita Contagem de Bactérias Totais e Contagem de Células Somáticas; Nos produtos: análises fiscais físico-químicas e microbiológicas exatamente como se é exigido nos produtos industrializados.
Além disso, a estrutura das pequenas fábricas deve atender requisitos iguais aos das grandes indústrias, sem que os mesmos sejam onerantes ao excessivo e nem interfiram na identidade do produto.
Como se vê, os fabricantes artesanais deverão se adaptar conforme as regras, caso já não o tenham feito, mesmo aqueles que fabricam os produtos mais famosos e tradicionais. Obviamente este não é um processo que se estabelece da noite para o dia.
Afinal, muitos deles viviam no obscuro, driblando a fiscalização para sobreviverem. Agora entendem que têm a possibilidade de se adaptarem, pois, suas exigências são passíveis de se conseguir enquanto empresas, muitas vezes familiares.
As exigências do MAPA, cujo rigor estabelece muitas vezes que os pequenos não tenham condição de as cumprirem,
custam muito caro.
Vejamos, neste sentido, como puderam ter êxito, por exemplo, o pessoal da Canastra: quando os pesquisadores iniciaram suas pesquisas ali, verificaram que muito poderia ser preservado, mas muito precisaria ser mudado, sem que se promovesse de fato a perda da identidade de seus produtos.
Eles se adaptaram! Hoje, o Queijo Canastra goza de lugar na fama dos queijos nacionais, faturando concursos mundo afora.
Em suma, o Brasil
só tem a ganhar com a formalização destes produtores / fabricantes. Ganha o consumidor, ganha a economia nacional e ganha a cultura regional de cada localidade, que deve ser preservada a unhas e dentes, já que a tradição queijeira do Brasil é uma das mais importantes do mundo!
Finalmente, gostaria de afirmar que somos sim, entusiastas ávidos do desenvolvimento de produtos artesanais.
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Aprovação da Lei nº 17.468/2018: Dep. João Amin, produtores e ativistas slowfood[/caption]
Da regularização destes, do aprimoramento da pequena produção, do crescimento da economia relativa, da possibilidade de trabalho e renda num país tão molestado!
E se isto levar tempo para acontecer, tenhamos paciência e senso humano para que tudo se encaixe, afinal, o primeiro passo já foi dado.
É preciso acreditar!
Desejamos que toda e qualquer pessoa que cumpra os requisitos exigidos, possam sobreviver neste mar de burocracia e rigor, que possam criar sabores e variedades, que possam honestamente e de forma segura, produzir e multiplicar seus queijos, perpetuando sua cultura e promovendo ao máximo possível de pessoas, o prazer único de consumir produtos indescritíveis ao paladar, pois a variedade de possibilidades nesse universo é infinita...
Viva o produto artesanal!!!
Foto da capa: Photo on Visualhunt.com
Alysson Christian de Oliveira é Técnico em Laticínios com mais de 20 anos de experiência de trabalho e Assessoria na Indústria Láctea Nacional e Internacional. Ministra palestras e cursos em universidades, indústrias e cooperativas, todos relacionados à Tecnologia de Produção, BPF, APPCC e PACs, Higienização Profissional, Economia e Mercado de Lácteos, além do Desenvolvimento de Produtos Derivados de Leite e Insumos Lácteos. Trabalhou como Consultor Técnico Comercial para algumas empresas de ingredientes no Nordeste, Sudeste e Sul do país. Efetuou trabalhos como Consultor do Sebrae na área de Tecnologia Látea e desenvolvimento de Cadeias Produtivas por 4 anos. Foi colunista para 2 jornais relacionados à área Rural e Produtiva Leiteira. Atualmente presta serviços de Consultoria para diversos Laticínios espalhadas pelo Brasil, bem como atua em Projetos Estruturais, além de Startups industriais.
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