CONCESSÃO DE PRAZO PARA ESGOTAMENTO DE EMBALAGENS DE ALIMENTOS
1. Considerando as solicitações recorrentes por parte do setor produtivo para concessão de prazo para esgotamento de embalagens de alimentos e a necessidade de adoção de procedimentos padronizados pelo Sistema Nacional de Vigilância Sanitária (SNVS) e pela Gerência-Geral de Alimentos (GGALI), foi feita consulta por esta Gerência à Procuradoria-Geral Federal junto à Anvisa acerca da legalidade da concessão de tal prazo.
2. Em resposta, a Procuradoria emitiu o PARECER CONS. Nº. 034/2012/PF-ANVISA/PGF/AGU, cuja síntese segue descrita a seguir.
3. A análise jurídica iniciou-se com a citação do Princípio da Legalidade Restrita, expressamente previsto no art. 5º, inciso II e art. 37 da Constituição Federal de 1988, segundo o qual o administrador somente pode fazer aquilo que a lei autoriza, não cabendo buscas alternativas à aplicação da norma, senão quando a própria norma permite expressamente a atuação discricionária.
4. Pelo atual modelo regulador, o Poder Legislativo conferiu poder normativo às agências reguladoras, não obstante, o exercício dessa função está demarcado pelos limites ou padrões traçados em lei, o que impede a concessão arbitrária de benesses em favor dos particulares ou perseguições. De fato, a sujeição do administrador aos ditames legais impede a concessão de privilégios ou tratamento diferenciado aos particulares, o que implicaria ofensa igualmente relevante para a Administração Pública, como os Princípios da Isonomia e da Impessoalidade, previstos nos arts. 5º e 37, respectivamente, da Constituição Federal de 1988.
5. O Princípio da Impessoalidade significa que a Administração não pode atuar com vistas a prejudicar ou beneficiar pessoas determinadas, uma vez que é sempre o interesse público que deve nortear seu comportamento (DI PIETRO, 2009). O princípio em causa não é senão o próprio princípio da igualdade ou isonomia, consagrado explicitamente no art. 37, caput, da Constituição. Além disso, assim como “todos são iguais perante a lei” (art. 5º, caput), a fortiori, também teriam de sê-lo perante a Administração (DE MELLO, 2005).
6. Ao publicar as Resoluções de sua competência, a Anvisa concede prazo para adequação para que sejam promovidas as medidas necessárias pelo setor produtivo para cumprimento das exigências da norma. Portanto, a Procuradoria pondera que a concessão de prorrogação de prazo a determinada(s) empresa(s) implicaria um favorecimento, em detrimento das demais, que agiram a tempo e modo, em obediência à legislação. Destarte, não merece acolhimento a pretensão de concessão de novo prazo a entes regulados específicos para o escoamento de embalagens em desconformidade com a regulamentação, eis que tal medida constitui literal ofensa ao cumprimento da legislação sanitária.
7. A Procuradoria avaliou também que se os motivos invocados pelo setor produtivo forem efetivamente substanciosos e relevantes para demonstrar que o prazo de adequação foi insuficiente e merece ser ampliado, tal prorrogação deve ocorrer de forma geral e abstrata, com alteração do Regulamento Técnico e ajuste de novo prazo de adequação em favor de todo setor regulado, de modo a preservar o cumprimento dos Princípios da Legalidade, Isonomia e Impessoalidade.
8. Quanto à previsão do art. 65 do Decreto-Lei 986/1969de que “será concedido prazo de 1 (um) ano, prorrogável em casos devidamente justificados, para a utilização de rótulos e embalagens com o número de registro anterior ou com dizeres em desacordo com as disposições deste Decreto-Lei ou de seus Regulamentos”, avaliou-se que o mesmo está em consonância com os entendimentos supra descritos, uma vez que a própria lei já conteve a expressa previsão do prazo de adequação e da possibilidade excepcional de prorrogação. Ainda assim, segundo a Procuradoria, não se mostra aconselhável, porque seria suscetível da investigação da pertinência e suficiência de cada motivação que deu ensejo à prorrogação para demonstrar que não houve mero favorecimento em favor apenas da empresa regulada e não do interesse público.
9. O Parecer CONS nº. 34/2012 conclui que: “Em face do exposto, especialmente em consideração aos Princípios da Legalidade, Isonomia e Impessoalidade, o posicionamento é no sentido de que, diante da ausência de previsão normativa, não é legítima a concessão de prazo para esgotamento de embalagens além do período de adequação expressamente previsto na norma, em favor de determinados agentes regulados que peticionam tal excepcionalidade. Aeventual prorrogação do prazo de adequação, devidamente motivada, deve ser contemplada de forma geral e abstrata, mediante alteração formal da regulamentação, a fim de prevenir tratamento com privilégios a determinadas empresas”.
10. Posteriormente à emissão do referido Parecer e sua divulgação aos entes do SNVS, a GGALI recebeu pleito proveniente de associação representativa do setor produtivo de alimentos para que houvesse reconsideração quanto à concessão para prazo de esgotamento de embalagens em ocasiões que não configurassem descumprimento de legislação sanitária, isto é, em situações distintas daquelas tratadas no Parecer CONS n. 34/212.
11. A GGALI considerou a demanda do setor procedente para determinadas situações que, de fato, não impliquem em risco à saúde, descumprimento da legislação sanitária e ou prejuízo de informação ao consumidor, como as listadas a seguir.
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SITUAÇÕES PASSÍVEIS DE CONCESSÃO DE PRAZO PARA ESGOTAMENTO DE
EMBALAGENS
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DETALHAMENTO
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1.
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Alteração de dados cadastrais
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Alterações de razão social, CNPJ, endereço da empresa, número do SAC.
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2.
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Transferência de titularidade
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Fusão, cisão, incorporação ou sucessão, conforme disposições da Resolução-RDC
n. 22/2010.
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3.
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Solicitação de substituição de marca
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Solicitação de substituição de marca aprovada anteriormente, em consequência de exigência técnica expedida na análise de petições
secundárias.
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4.
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Petições de alteração de rotulagem
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Petições de alteração de rotulagem, desde que não impliquem em prejuízo à informação do consumidor, equívoco em relação às informações obrigatórias estabelecidas na legislação, risco sanitário ou não atendimento aos princípios gerais de rotulagem de alimentos embalados
estabelecidos na Resolução-RDC n. 259/2002.
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5.
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Erro ortográfico
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Erro ortográfico, desde que não implique equívoco em relação às informações obrigatórias estabelecidas na legislação, risco sanitário ou não atendimento aos princípios gerais de rotulagem de
alimentos embalados estabelecidos na Resolução-RDC n. 259/2002.
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6.
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Alterações em ilustrações
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Alterações em ilustrações, desde que não impliquem em prejuízo à informação do consumidor, equívoco em relação às informações obrigatórias estabelecidas na legislação, risco sanitário ou não atendimento aos princípios gerais de rotulagem de alimentos embalados estabelecidos na Resolução-RDC n.
259/2002.
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7.
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Embalagens sazonais ou promocionais
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Embalagens sazonais ou promocionais, desde que as informações não impliquem em prejuízo à informação do consumidor, equívoco em relação às informações obrigatórias estabelecidas na legislação, risco sanitário ou não atendimento aos princípios gerais de rotulagem de
alimentos embalados estabelecidos na Resolução-RDC n. 259/2002.
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11. É imperativo ponderar que o esgotamento de embalagens e as situações potencialmente admissíveis são temas complexos e perpassam outros produtos e serviços sujeitos à Vigilância Sanitária. Desse modo, o assunto “Autorização para Esgotamento de Estoque de Produtos Sujeitos à Vigilância Sanitária” foi inserido na Agenda Regulatória da Anvisa biênio 2013-2014 (tema 109, disponível em: http://s.anvisa.gov.br/wps/s/r/czMh) e será objeto de regulamentação pela Agência.
12. Destarte, no ínterim até a publicação do regulamento, recomendamos ao SNVS que:
a) Considere, primariamente, como alicerce para tratamento do tema, o Parecer CONS nº. 34/2012;
b) Como prática excepcional, em casos de solicitação de prazo para esgotamento de embalagens de alimentos que não configurem infração sanitária, risco sanitário à população ou informações enganosas ao consumidor, como nas situações descritas na tabela acima, o requerimento deve ser avaliado pela autoridade sanitária competente, caso a caso, com o devido registro da fundamentação para seu deferimento ou indeferimento;
c) Nos casos de categorias de alimentos com registro obrigatório, o pedido de esgotamento de embalagens deverá ser feito à Gerência-Geral de Alimentos (GGALI) da Anvisa;
d) Nos casos de categorias de alimentos isentas da obrigatoriedade de registro, o pedido de esgotamento deverá ser feito ao órgão de Vigilância Sanitária local, obedecendo-se as devidas competências de fiscalização pactuadas pelos níveis estaduais e municipais de cada Unidade Federada;
e) A autoridade sanitária competente deverá examinar a veracidade dos fatos, avaliando a motivação, a quantidade de embalagens a ser esgotada, a data da produção das mesmas, a previsão de esgotamento apresentada pela empresa e outros critérios que julgar pertinentes, a fim de subsidiar a determinação do prazo;
f) Nos casos de deferimento do pedido de esgotamento de embalagens de alimentos comercializados em mais de uma Unidade Federada, a autoridade sanitária que concedeu o esgotamento de embalagens deverá encaminhar à GGALI/Anvisa, documento com informações claras sobre o nome, a marca, a identificação de origem (fabricante, CPNJ, endereço), o motivação da solicitação, as justificativas do órgão competente e o prazo concedido para o esgotamento. A GGALI/Anvisa, por sua vez, disponibilizará essas informações aos interessados.
g) No caso de deferimento do pedido de esgotamento de embalagens, recomendase que a empresa mantenha cópia do documento emitido pela autoridade sanitária competente, caso necessite apresentá-lo a outro órgão competente.
13. Ressaltamos por fim, que as situações listadas na tabela não são categóricas ou conclusivas, devendo apenas servir de orientação para avaliação pela autoridade sanitária competente, até a publicação de regulamento específico pela Anvisa. Circunstâncias distintas daquelas apresentadas e que não impliquem em prejuízo da informação ao consumidor, equívoco em relação às informações obrigatórias estabelecidas na legislação sanitária vigente ou risco sanitário podem ser avaliadas caso a caso pela autoridade sanitária competente.
Referências
1. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Editora Atlas S.A., 2009. Pág 67.
2. DE MELLO. Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Editora Malheiros, 2005. Pág. 102.
3. BRASIL Decreto-Lei n. 986, de 21 de outubro de 1969. Institui normas básicas sobre alimentos. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 21 out. 1969.
4. BRASIL. Congresso Nacional. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 5 out. 1988.
5. Procuradoria Federal junto à Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa. PARECER CONS. Nº. 034/2012/PF-ANVISA/PGF/AGU
NFORME TECNICO